Precatórios do IAA transformam-se em receitas reais
para usinas do país
Fachada da sede do IAA na Praça XV, no
Rio de Janeiro, em foto de 1987
Algumas companhias já receberam nos últimos oito anos indenizações após entrarem na Justiça, mas o leque de usinas deve crescer após decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF) em ação movida pela Copersucar – processo que envolve a maior indenização no setor nesse caso. Diante dessa vitória, muitos grupos, inclusive de capital aberto, começam a incorporar receitas futuras derivadas dessa decisão judicial em seus balanços.
A decisão do STF estabeleceu que a Copersucar tem R$ 5,6 bilhões a receber parceladamente a partir deste ano – valor que será rateado entre as usinas que eram cooperadas em 1990. O valor foi depositado em juízo e aguarda posição da União, cujo prazo para manifestação é semana que vem, segundo o advogado Hamilton Dias de Souza, que representa a cooperativa. Há mais um pleito da cooperativa, de R$ 12,8 bilhões, em discussão na Justiça.
Para o advogado Gabriel Buscarini Leutewiler, do escritório Santos Neto, somadas outras ações que ainda podem surgir movidas pelas empresas que eram associadas à Copersucar, o valor a ser pago às usinas pode alcançar cerca de R$ 30 bilhões. Dias de Souza preferiu não fazer estimativa.
“Todas as empresas que tiveram prejuízos com o tabelamento do IAA estão reclamando seus direitos. Existe uma avalanche de ações na Justiça”, lembrou Leutewiler.” Como o STF reconheceu a legitimidade dos precatórios do IAA, estabeleceu-se inclusive um mercado para esses precatórios que atraiu a atenção de muitos bancos de investimentos”. Criado pelo presidente Getúlio Vargas em 1933, o Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) definiu diretrizes para o segmento até 1990, quando foi extinto pelo governo de Fernando Collor de Mello em meio a acusações de incompetência, corrupção e muitas críticas do setor privado.
Conforme o advogado do Santos Neto, que representa algumas usinas associadas da Copersucar em processos em curso, os precatórios reconhecidos pela Justiça tendem a ser pagos em um período de três a sete anos. “Não são títulos públicos, mas [uma vez reconhecidos pela Justiça] têm pagamento garantido”. O montante exato dos precatórios garantidos pela Copersucar que deve virar caixa para as usinas deve ser menor que o valor a que têm direto. Por ser cooperativa, a Copersucar questionou a Receita Federal para saber se precisará recolher impostos sobre esse recurso, mas ainda não obteve resposta. De qualquer forma, ao menos parcela desses precatórios é considerada pelas ex-cooperadas como receita provável.
A Raízen Energia, dona de uma das usinas que no passado era associada à Copersucar, já reconheceu em seu balanço do primeiro trimestre da safra 2018/19 (abril a junho), R$ 75,406 milhões em “crédito de ações indenizatórias” na rubrica de “outras receitas operacionais líquidas”. Trata-se de um valor relevante, dado que a companhia encerrou o intervalo com lucro líquido de R$ 4,1 milhões.
No fim do ano passado, a Cosan, que detém 50% da Raízen Energia, vendeu seus direitos creditórios referentes a precatórios do IAA para duas gestoras de recursos, a Jus Capital e a Farallon Latin America Investimentos. A soma dos direitos, de R$ 3,5 bilhões, foi vendida por R$ 1,3 bilhão, acrescida de um percentual fixo atrelado ao prazo do efetivo recebimento dos direitos cedidos.
O Grupo São Martinho, que assumiu usina antes associada à Copersucar, fez referência a um crédito a receber em seu balanço, mas ainda não o reconheceu como receita. A companhia, que afirma ter a receber R$ 730,5 milhões do valor já depositado em juízo, classificou a indenização como “crédito provável, mas não sob seu controle”. Embora o recebimento desse montante em seu caixa dependa da liberação dos recursos para a Copersucar, a companhia avalia que o quinhão ao qual tem direito pode se tornar caixa até o fim de setembro, disse o diretor financeiro Felipe Vicchiato em teleconferência com analistas.
Associada à Copersucar, a Zilor também mencionou em seu balanço da safra 201/18 que deve receber sua parcela na indenização de R$ 5,6 bilhões, mas não revelou a fatia à qual teria direito, apenas citando um “crédito provável, mas não praticamente certo”. O Valor apurou que também há usinas que têm usado os precatórios como garantia em negociações de empréstimos. O Grupo Virgolino de Oliveira (GVO), por exemplo, pretende utilizá-los como remuneração adicional em uma emissão de US$ 200 milhões em bonds, que serão oferecidos aos atuais bondholders que detêm US$ 1,8 bilhão em títulos da companhia. Procurada, a empresa preferiu não comentar.
Matéria Publicada no Valor Econômico.